A Morte Não É o Fim: O Culto dos Ghedes no Vodu Haitiano
- Marlon
- 9 de jun.
- 5 min de leitura
Atualizado: há 5 dias
Olá, pessoal! Tudo bem?
Sou Paulo Bulgarelli, também conhecido como Doctor Wolf, e hoje tenho a honra de compartilhar com vocês um conteúdo muito especial. Convidei o Frater Marlon — um grande sacerdote helênico dedicado à deusa Hécate, conjure, bruxa, sevetyie, dentro do culto tradicional Yorùbá é conhecida como Olaifá. — para escrever um texto exclusivo para o meu site e blog, Bulgarelli Tarô Hoodoo.
Agradeço imensamente ao Frater: Frater Marlon pela generosidade, atenção e pela valiosa contribuição ao trazer seu saber sobre sua arte mística e magicka do Vodou Haitiano.
Texto abaixo por: Marlon
Me chamo Marlon, sou sacerdote helênico dedicado à deusa Hécate, conjure, bruxa e sevetyie. Dentro do culto tradicional Yorùbá, sou conhecida como Olaifá.
Atuo como pesquisadora nas áreas de cultura afro-diaspórica e feitiçaria, explorando as conexões espirituais, históricas e políticas que atravessam a religiosidade negra.
Minha vivência é entre os mundos e minhas práticas são enraizadas tanto no respeito às ancestralidades quanto na constante construção de saberes.
A Morte Não É o Fim: O Culto dos Ghedes no Vodu Haitiano
Para nós, praticantes do Vodu, a morte definitivamente não representa um fim — ela é apenas uma transição. A necromancia faz parte das nossas práticas espirituais, e a comunicação com os mortos é algo vivo e cotidiano. Mantemos relações com nossos ancestrais, com os bakas, os djabs e, especialmente, com os Ghedes.
Hoje, quero falar um pouco sobre essa poderosa e irreverente família espiritual dentro do Vodu Haitiano: os Ghedes.
Ao contrário do que muitos pensam, os Ghedes não formam uma nação de lwas, mas sim uma família. E um dos aspectos que os tornam únicos é que, para nos comunicarmos com eles, não é necessário passar pelo intermédio de Papa Legba — algo raro no Vodu, onde Legba geralmente é quem abre os caminhos entre os mundos.
Os Ghedes são intensamente humanos em seus modos: Mundanos, debochados, obscenos e, ao mesmo tempo, dotados de uma sabedoria crua e direta. São espíritos que não têm medo de dizer verdades incômodas. Apesar de sua irreverência, são extremamente poderosos em trabalhos de cura — tanto física quanto espiritual.
Como toda família, os Ghedes têm sua hierarquia: No topo está Bawon Samdi (ou Baron Samedi), senhor dos cemitérios, acompanhado de sua esposa, Maman Brigitte. Vale lembrar que cada cemitério possui seu próprio Bawon, pois o primeiro homem enterrado em um campo santo, após 150 anos, torna-se o Bawon Samdi daquele local.
Dentro do Vodu Haitiano, a morte é presença, é portal e também é cuidado.
OsGhedes nos ensinam que até mesmo do outro lado, a vida continua — cheia de sabedoria, provocação e cura.
Entrando no Cemitério: Reverência e Ritual no Vodu
Para nós, praticantes do Vodu — sejamos mambos, hougans, sevetyies ou bokors —, o cemitério não é apenas um espaço físico: é um reino. E, como todo reino, exige respeito, reverência e consciência espiritual. Nele habitam forças, entidades e mistérios que não devem ser tratados com descuido.
Antes de adentrar esse espaço sagrado, é comum nos purificarmos com um banho de arruda. Esse banho limpa as energias e nos prepara espiritualmente para cruzar os portões do mundo dos mortos. Ao chegar ao cemitério, saudamos com a expressão "Kwa Sembo", em honra aos espíritos que ali residem,e 3 moedas.
Nada que se retira do cemitério deve ser levado sem oferecer algo em troca.
Todo elemento, objeto ou energia retirada deve ser pago — esse pagamento pode ser feito com moedas, velas, bebidas, doces, entre outros. Eu, particularmente, costumo oferecer moedas. Essa troca não é apenas simbólica: é uma demonstração de respeito pelas forças que guardam aquele espaço.
Dentro do culto aos Ghedes — a família de lwas ligados à morte e à ancestralidade — há dias específicos que lhes são dedicados: segunda, sexta e sábado. Suas cores são o preto e o roxo, e sua bebida favorita é o Piman, um preparado forte e ardente feito com pimentas. É uma bebida ritualística, impossível de ser consumida por qualquer um, tamanha sua intensidade.
Os Ghedes dançam de forma provocante e sexualizada, mas longe de ser algo profano, esse comportamento é expressão de vitalidade, alegria e conexão com a vida, mesmo diante da morte. Eles nos lembram que rir, dançar e celebrar também são formas de resistência e cura.
Entrar no cemitério, portanto, é mais do que um ato físico — é atravessar um limiar espiritual. E cada passo dentro desse reino deve ser dado com consciência, humildade e coração aberto.
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